segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

A verdade nua, crua e sem tempero sobre o meu fim de semana

As tentadoras coisas da carne
Não suporto comer fora mais do que 5 ou 6 vezes por ano. Mesmo assim, se houver real e incontornável necessidade. Não é que eu tenha algum trauma com os restaurantes. Até acho alguns muito simpáticos. A questão é que eu mantenho um já antigo caso de amor com a comida caseira, só interrompido por breves períodos.
Meu estômago é interiorano e tímido. Suspeito de que seja também socialista. Fica feliz e emocionado ao saber que aquilo que lhe está sendo servido, mesmo que seja o mais franciscano arroz com ovo, foi preparado num ambiente doméstico, artesanalmente, em escala de produção não capitalista.
O problema são os sábados e domingos, principalmente estes. Nessas ocasiões, como preceitua a CLT (uma conquista socialista), minha cozinheira folga. Sabendo da minha dificuldade de pular a cerca para comer fora, ela se dispõe gentilmente a trabalhar dobrado na manhã de sábado para deixarum prato pronto para o dia seguinte.
São pratos práticos e simples por exigência das minhas limitações. O máximo que aprendi acerca do fogão foi que ele esquenta coisas com a ajuda de gás. Mas a verdade nua, crua e sem tempero é que não suporto mais a sequência lasanha-torta de frango-macarronada alternando-se nos fins de semana...
Meu estômago, que também é dado à defesa do meio ambiente, fica profundamente deprimido quando penso em coisas verdes e no quanto elas fazem falta na mesa de domingo. Saber que existe em casa, ao alcance das mãos, alface, rúcula, couve, abobrinha, xuxu e tantas outras tentações faz com que ele se sinta um eunuco num harém.
Ontem à noite foi de novo a vez da torta de frango. Do que se pode deduzir que os dois fins de semana anteriores foram, respectivamente, da lasanha e da macarronada. Ocorreu então o inusitado. Cansado desse trio monótono repetindo-se mês após mês, meu estômago queixou-se em alto e bom som.
Eu ouvi a queixa à noite, quando me preparava, resignado, para levar ao microondas um requentado pedaço da torta de frango. E eis que surge um rumor inequívoco de entranhas, não daquele tipo que elas fazem pedindo guloseimas, mas um som estranho, como se houvesse algo se recolhendo, se fechando.
Cumpro o doloroso dever de informar que meu estômago, com o perdão do neologismo pouco adequado ao nível da platéia, brochou diante da torta deitada um tanto sonolenta no prato levado ao forno. Não houve artifício ou tempero, nem mesmo o azeite, poderoso afrodisíaco do paladar, capaz de elevar sua moral.
Envergonhado, eu, que não gosto de falhar na hora H, não tive outra saída senão dar um grito de Independência. Ele saiu da minha garganta às 20 horas e 11 minutos, num único vocábulo acompanhado de ponto de exclamação: "Chega!". Dito de mim para mim, esse grito teve a força de me devolver o ânimo.
Sim, chega dessa monotonia. Não há caso de amor gastronômico que aguente as mesmas coisas feitas do mesmo modo por meses e meses. Meu estômago é jovem, saudável e assumidamente carnal: não quer levar vida de abstinência, como se fosse um monge capuchinho fazendo greve de fome para elevar sua alma acima das tentações.
Ele quer novos amores, e não posso recriminá-lo. Como pedir a ele que passe o fim de semana se alimentando de suas memórias sobre as delícias da carne sem lhe dar a oportunidade de novamente experimentá-las? Não, não posso condená-lo a isso. É cruel demais. É contra a natureza. É desnecessário.
Mas não quero uma cozinheira diferente no domingo, pois tenho problemas para me acostumar com o tempero, que, para mim, é o segredo do amor culinário duradouro. Resta-me comunicar que retomei o já esquecido projeto de aprender a cozinhar. Estou de volta ao aprendizado das panelas, na esperança de fins de semana mais prazerosos.
Domingo é o Dia da Criação. Hei de conseguir, o mais rápido possível, criar pratos com arroz solto, feijão preto, alface, costelas (ah, as costelas...), abobrinhas, entre várias outras beldades. Meu estômago, que é afeiçoado aos clássicos gregos e latinos, não vê a hora de começarmos nossa orgia dominical.

3 comentários:

mariza lourenço disse...

Bravíssimo!

Márcio, estou orgulhosa do meu amigo de Oliveira. é, realmente, emocionante imaginá-lo à maneira de D. Pedro, bradando por liberdade... hehehehehe.

aprenda mesmo a cozinhar, com o tempo e desenvoltura inventará seus próprios pratos. e não existe nada melhor que isso. porque cozinha também é amor. e arte. palavras de uma excelente (e modesta)cozinheira (eu).

menino, costela é tudo de bom, mas é complicado deixá-la no ponto. recomendo que comece pelo bom e velho arroz e depois parta para o feijão novinho. querendo, mando receita, toda explicadinha... hehehehe.

mais um, entre tantos, excelente texto.

boa semana. abraços.

Letícia disse...

Li uma crônica de amor. Estômago amante que busca novidades e coisas que façam bem. O que mais admiro em seus textos é isso. Você pega um palito de fósforo e transforma em uma verdade que muitos vivem. E leio solidão, romantismo e sua comparação - bastante coerente - entre comida e a relação homem-mulher e o cotidiano.

Anônimo disse...

Nossa, cozinhar é divino, e não tem nada melhor do que comermos com os olhos primeiro, exitem pratos fáceis de fazer e muito lindos de enchem nossos olhos de satisfação. Uma receita pratica para vc mesmo preparar pegue aboboras meninas aquelas verdinhas parta as no meio tire um pouco da polpa. Dê uma verventada não mto tempo pois podem desmanchar pegue uma ricota amasse e misture ervas finas com um pouco de sal misture e recheia as aboboras polvilhe queijo por cima leve ao forno ou microondas decore com ramos de manjerição e tomates secos saboreie é maravilhoso depois vc me fala se fez e se gostou abraços tenha uma otima noite