Dediquei parte da noite a reflexões sobre a minha já antiga queda pelo vinho. É comum que o apreciador pergunte a si mesmo, em algum momento da vida, quais são os vinhos que melhor expressam suas aspirações. Sem a pretensão de esgotar o assunto, que é vasto, muito menos a de dar sobre ele a última palavra, tenho cá a minha escala de avaliação. Personalíssima, ela não serve a ninguém além de mim, mas nem por isso a julgo ruim. Além disso, ela tem critérios simples, o que me parece uma de suas grandfes vantagens.
É bom vinho, segundo a minha escala avaliativa, aquele que leva ao sonho e não ao sono. A melhor casta vinífera, por sua vez, é a que mostra que se podem degustar momentos vividos, tanto quanto porções de líquido, e que cada instante, para quem o experimenta, tem um sabor único e irrepetível. Está no ponto, a meu ver, a bebida que traz uma confirmação saborosa para a ideia de que cada coisa tem o seu tempo. Por outro lado, o melhor bouquet é o que educa o nariz para as muitas nuanças de odores das quais o mundo é feito.
É digna de altas notas a garrafa que, chamando a atenção para o cultivo da uva e a sua transformação em líquido, permite vislumbrar a obra de arte que existe em todo trabalho bem executado e a dignidade de todos os ofícios exercidos como ato de criação. Merece o rótulo de obra-prima, enfim, quaisquer que sejam seu tipo e suas características, o vinho que proporciona a convicção de que o amargo e o doce são os dois lados de uma mesma moeda ou, se preferirmos, os dois elementos que se alternam para dar sabor à existência.
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